As horas não passam.
Antecipo a sua falta já ao
acordar, com teu corpo rígido milimetricamente disposto ao meu lado, na cama.
Acordamos ao som dos tambores que
tanto gostas. É aí que inicio minha jornada de não-você.
São horas de entrega. O dia todo
nos doamos a quem e ao que não nos pertence. Ao que não nos interessa no
íntimo.
Saímos, ambas, esgotadas desse
vértice que nos distrai. Como uma criança dou passos ligeiros ao seu encontro.
Todo dia. Uma vida de espera.
Ao seu lado aprendi a pedir. E
tenho exercitado o receber.
Tu que me entregas sempre o que
te peço. Sei que logo chega o dia em que o pedido será dispensável.
Hoje, recebo com um sorriso
aberto tudo que me dizes no afago sem igual das palavras doces. Que só são tão
doces por saírem de sua boca.
Recebendo, então, te entrego
também. Quando você me dá seu corpo como um presente, quando o despe por saber
que o meu está a sua espera, te entrego o calor do que faz de mim mulher.
Recebo, então, quando me dizes
com olhos úmidos que já não lhe amo mais, a confirmação de que a semente de
amor que lhe dei há tempos, nasceu em você.
Quem dera tudo isso estivesse ali na minha porta hoje.
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